quarta-feira, outubro 31, 2007

A propósito das alterações climáticas


por Fernando Reis (professor e director do Jornal do Algarve)

O “Verão” outonal que estamos a viver, com tempo seco e temperaturas anormalmente altas - muito acima da temperatura média para esta época – fazem-nos reflectir sobre as alterações climáticas que o chamado “efeito de estufa” tem vindo a provocar à escala planetária e o crescente risco de desertificação da Península Ibérica.

Há dias, no seu périplo por Espanha, depois de já o ter dito em Portugal, Al Gore sublinhou isso mesmo: pela sua localização geográfica, a grande massa de terra no seu interior, enquadrada por altas cadeias montanhosas e a crescente influência do ar quente proveniente do Norte de África, a Península Ibérica, sobretudo o interior sul – será a principal vítima do aquecimento global, que as emanações de CO2 têm alimentado. Apoiado em estatísticas, o ex-candidato à Casa Branca lembrou que os períodos de seca são cada vez mais amplos, com o intervalo entre as chuvas a passar de 50 para 60 dias e admitiu que o Verão possa prolongar-se por mais duas a cinco semanas, não se esquecendo de alertar para os riscos de extinção de espécies como a águia imperial e o lince ibérico. A invasão do Mediterrâneo por pragas de medusas e o aumento do número de incêndios florestais são outros indicadores de uma tragédia anunciada, que o Mundo tem obrigação de travar. Mas não são apenas estes os problemas que ameaçam a Península Ibérica, como consequência do aquecimento global, também corremos o risco do aparecimento de doenças tropicais, como o paludismo, a erosão do litoral e a alteração do regime de chuvas, com secas e cheias repentinas.

Há 20 anos, quando Al Gore iniciou a sua cruzada em defesa do Meio Ambiente, muitos não levaram a sério o alerta e, ainda hoje, há quem prefira enterrar a cabeça na areia como a avestruz, não se importando de deixar como legado um planeta em agonia.

O exemplo que aqui vamos deixar veio de Espanha, mas também podia vir dos EUA, que teimosamente se recusam a assinar o Protocolo de Quioto ou do nosso próprio país, onde continua a existir quem, por ignorância ou interesse próprio, rejeita o apocalipse climático. Mariano Rajoy, o líder do Partido Popular, falando em Maiorca, na mesma conferência em que Al Gore deu conta das suas preocupações, invocou, perante a incredulidade dos presentes, o testemunho de um primo, catedrático de Física em Sevilha, que uma vez lhe disse: “Se ninguém é capaz de garantir o tempo que vai fazer amanhã em Sevilha, como é que alguém pode dizer o que se passará no mundo daqui a 300 anos?”

É esta frivolidade do discurso político, que também existe em Portugal, que é preciso combater, se quisermos, efectivamente, lutar de forma séria e honesta contra o aquecimento global. Será que devemos escudar-nos em preconceitos político-ideológicos ou em interesses particulares quando está em causa a nossa própria sobrevivência? Infelizmente também o Algarve e o país não têm sido poupados à voragem desses interesseiros.

NOTA: Os comentários de Fernando Reis são emitidos todas as quartas-feiras, às 8,30 horas, com repetição às 13 e às 19 horas.