quinta-feira, junho 21, 2007

O Algarve precisa de coesão territorial

por Hélder Nunes (jornalista e director do Barlavento)

A coesão da região algarvia só se poderá manter se houver um desenvolvimento equilibrado, isto é, o Barrocal e a Serra não podem ficar no lado de lá do Litoral, se bem que as realidades sejam diferentes e não se pretenda, de forma alguma, aplicar no interior, a política de cimento que se deixou alastrar por toda a costa.

São realidades bem diferentes. O Barrocal, zona onde se deve incrementar projectos agrícolas ou áreas industriais não poluentes e a Serra com potencialidades para a floresta, áreas cinegéticas e turismo rural.

Estas podem ser, eventualmente, algumas das políticas de desenvolvimento a implementar, na certeza de que as aldeias devem ser abertas a alguma expansão habitacional.

A fixação das pessoas às terras do interior é accionada e fomentada com as condições básicas que garantam o mínimo de qualidade de vida.

Ninguém quererá viver, neste tempo de globalização, numa terra que não tenha luz eléctrica, esgotos públicos, água canalizada, assistência na saúde, escola, acesso à Internet, já para não falar no mínimo de segurança, e sem aquilo que a nós nos parece de mais importante e básico para um crescimento saudável, uma boa rede de estradas e de comunicações entre elas.

A fase das infra-estruturas básicas – luz, água e esgotos – está devidamente acautelada na quase totalidade dos concelhos algarvios e a rede de estradas está em vias de se concretizar.

Com os melhoramentos efectuados nos últimos anos, torna-se possível uma comunicação mais ao menos célere, entre as aldeias.

Depois, entra-se nas áreas mais problemáticas, como a saúde. Não se pode ter um hospital em cada aldeia, é uma realidade evidente.

Mas, as unidades móveis, que tão bons serviços têm prestado às populações do interior, podem ficar sediadas numa aldeia que, com facilidade, responda a qualquer chamamento.

As Juntas de Freguesia, para não se multiplicarem os postos médicos, podem disponibilizar espaços, e são um meio físico já existente, onde as pessoas das unidades móveis podem descansar e sediar-se, criando condições mínimas de conforto.

Julgo que a imaginação deve funcionar nestas coisas, e, com um pouco de boa vontade e desejo de servir quem está mais longe dos grandes centros, encontram-se soluções que, sem serem dispendiosas, são úteis e dão alguma estabilidade emocional a quem vive no Barrocal ou na Serra.

As escolas da Serra que têm vindo a fechar, porque não possuem um número suficiente de alunos, porque razão não passam a ser utilizadas pelos alunos das cidades?

Se há deslocação de alunos do interior para o centro, porque não fazer a experiência do centro para o interior? Talvez os alunos e os seus pais passem a olhar a Serra e o Barrocal com outro interesse.

Trazer meia dúzia de alunos da Serra para o Litoral tem tantos custos, como levar alunos do Litoral para a Serra. E se este tipo de política não se desenvolveu, foi porque os responsáveis permitiram e incentivaram o despovoamento das aldeias serranas.

Quando se deslocam os jovens daquelas zonas para o Litoral, os ditos responsáveis mais não estão a fazer do que convidar os pais a seguirem as pisadas dos filhos.

Falamos em coisas simples, mas tudo passa por desenvolver programas de crescimento para as terras do interior, envolvendo as empresas, as autarquias, as associações locais, de forma a que se concretizem projectos rentáveis para todas as partes envolvidas.

Em abono da verdade, nada se faz ou pouco se tem feito, para motivar a fixação das pessoas em áreas que ameaçam a desertificação humana. Já estão pagos todos os subsídios respeitantes às indemnizações dos incêndios dos últimos anos?

Sou anti-burocratização. Quando se verificaram os incêndios, por exemplo, a política que, no meu entender, deveria ter sido aplicada, era deste tipo: fazer o levantamento dos haveres das pessoas - como quantos porcos perdeu, vacas, árvores, como ficou a sua casa - e, de imediato, dar-lhe os porcos, a vaca, plantar as árvores, reconstruir a casa, já com condições dignas de habitabilidade, e, só depois, saber se a propriedade estava registada, qual o número cadastral e, caso nada disso estivesse feito, deslocar uma equipa que ajudasse as pessoas a legalizarem a sua propriedade, sem grandes burocracias e complicações.

Não foi isso que foi feito. A primeira coisa era saber se tudo estava legalizado e, depois, logo se tratava do resto, num convite ao abandono das terras e à desertificação da Serra, porque são muito poucos os jovens que lá moram e os mais antigos faziam da palavra dada uma coisa muito séria.

Um hábito que, infelizmente, se perdeu, nesta sociedade consumista e, quanto das vezes, vigarista.

NOTA: Os comentários de Hélder Nunes são emitidos todas as quintas-feiras, às 9 horas, com repetição às 15 e às 21 horas.