segunda-feira, junho 05, 2006

O Ciclismo em Tavira

por Carlos Lopes (advogado, benfiquista e animador cultural)

Nos anos cinquenta e sessenta o ciclismo era uma doença para mim e para muita gente em Tavira. Todas as aldeias tinham os seus “heróis”. Os seus campeões. Luís Canoco, os irmãos Palmeira, Jorge Corvo, Alcides Neto, Pontalinho, Indalécio de Jesus, Henrique Neto, António Graça, Pedro Bárbara, Sérgio Páscoa e muitos outros, encheram a nossa imaginação e a nossa alma. Eram heróis de ao pé da porta que rivalizavam com os das grandes cidades e com os campeões de Portugal.

A vida a isso proporcionava. Assistia-se ao boom da construção civil. Acabada a escola, já não se ia para ofícios tradicionais mas para trolha. Ganhava-se logo e não se levava anos a trabalhar para o mestre, sem ganhar nada. Se se ia a pé para os locais mais perto, tinha-se de ir de bicicleta para Faro, Albufeira e Monte Gordo (sítios onde a construção disparou em flecha). Com duas sardinhas fritas no saco, ou um ovo frito e um pedaço de pão, lá se ia antes das sete para o trabalho. E iam muitos. Ia-se em bando, em pelotões de dez e mais ciclistas. Andavam-se quilómetros em “treino”. Aos domingos, na pista mostravam-se as habilidades. Assim se desenvolveu o ciclismo. O Ginásio, clube fechado e elitista, dava guarida e o nosso herói maior: Jorge Corvo.

O tempo passou, Salazar deu lugar a Marcello Caetano, as bicicletas deram origem às motorizadas e estas aos automóveis. As bicicletas, como meio de transporte, deu origem à bicicleta como instrumento lúdico. Ao Ginásio sucedeu o Clube de Ciclismo pela mão desse “doente” que é o Engº Brito da Mana. Ao ciclismo amador, ou semi amador, sucedeu-lhe o ciclismo profissional. Ao amor à camisola, sucedeu-lhe o amor pelo que se ganhava. Aos “heróis” locais sucederam os ciclistas profissionais estrangeiros. O ciclismo já não é o que era. Já não temos heróis.

A insistência nesta actividade, como se vivêssemos nos anos sessenta, nada tem de sensato. Hoje o ciclismo é uma actividade na mão das grandes firmas, em que o espectáculo e a eficiência da publicidade se sobrepõem a qualquer lógica. Talvez nem justifique os rios de dinheiro que faz correr. Não sei se tem retorno. Sei, isso sim, que já não faz correr as multidões com o entusiasmo que fazia correr, ainda que seja sempre um espectáculo bonito. Perdoem-me os incondicionais, o ciclismo já foi em Tavira.


NOTA: Os comentários de Carlos Lopes são emitidos todas as segundas-feiras, às 11 horas, com repetição às 17 e às 23 horas.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Este comentario demonstra uma grande mostalgia do autor, no entanto e apesar da evolucão dos tempos e do profissionalismo dos ciclistas ainda continuam a existir os herois da nossa cidade e são esses que acabam por ser os verdadeiros herois do ciclismo de Tavira. Por exemplo o Pedro Martins de Santa Margarida o Helder Lopes da Conceiçao, o Pedro Lopes de Santo Estevão, e mais recentemente aquele moço da serra da Cortelha que esqueci o nome.

5:22 da tarde  

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