quinta-feira, março 08, 2007

Grande português

por Hélder Nunes (jornalista e director do Barlavento)

O concurso que a RTP lançou, denominado «Os Grandes Portugueses», que funciona com os votos dos telespectadores, seleccionou dez nomes – D. Afonso Henriques, Cunhal, Salazar, Aristides de Sousa Mendes, Fernando Pessoa, Infante D. Henrique, D. João II, Camões, Marquês de Pombal e Vasco da Gama – partindo, agora, na busca daquele que será o «Grande Português».

Cada um na sua época foi o que foi, e com isto não pretendemos, de forma alguma, defender este ou aquele tipo de política imposta por cada figura. Foram épocas.

Em abono da verdade, hoje, principalmente entre os jovens, assistimos a um certo descrédito da democracia, e começa a ser preocupante e normal vermos saudações nazis e outro tipo de manifestações anti-democráticas, que devem ser o alvo das nossas atenções. Estes jovens de hoje serão os adultos de amanhã, fruto da preparação política que receberem no dia-a-dia.

O que acontecer no futuro é culpa de todos os adultos de hoje. Assim como houve um 25 de Abril, por culpa de uma ditadura que nos governou durante 50 anos, pode dar-se o inverso dentro de 20 anos.

Os políticos de hoje, a ditadura disfarçada dos partidos, que mascaram os actos metendo no meio uns ditos independentes, com tendência para a esquerda ou para a direita, não são fomentadores da cidadania, da ordem democrática. Aplicam princípios de conveniência em quase tudo em que é intervenção estatal. Infelizmente.

Se olharmos para a maioria dos políticos que saíram do circuito da Assembleia da República, dos Governos e de outros lugares de nomeação, vamos encontrá-los nas administrações de empresas, isto é, a convivência entre o poder político e o económico é por demais evidente.

A protecção das forças partidárias, por vezes até de forma indirecta, existe. A credibilidade cai pela base quando o povo, sentindo-se lesado pela má gestão de um político, acaba por vê-lo recompensado com um cargo internacional ou numa empresa da esfera do Estado. Tem sido assim e vai continuar a sê-lo, a menos que as regras eleitorais se alterem, e todos os cidadãos, independentemente de pertencerem a um partido, possam concorrer ao lugar de deputado ou a outro qualquer onde o povo seja chamado a votar.

Como é que vamos classificar o facto de o turismo, principal indústria do Algarve e a que mais contribui para o enriquecimento do país, ser considerado pelo actual Governo do PS, aquele que afirmava que as pessoas estavam primeiro, como uma área estratégica não relevante?

Quando o Algarve, no actual Quadro de Referência Estratégico Nacional, é prejudicado na atribuição dos fundos comunitários na ordem dos milhões, só podemos pensar que estamos a ser marginalizados e explorados. Como o povo explorado e marginalizado é característica de determinados regimes políticos, pela lógica, não estamos em democracia, pois não?

Miguel Freitas, presidente da Federação do PS Algarve, voltou a convidar-me para participar no seu Conselho Consultivo, do qual saíram alguns dados interessantes, mas tudo isso seria óptimo se nos encontrássemos numa região onde o sistema educativo formasse bons e altos valores, onde não existissem 150 mil famílias com fome, etc. Tudo tem valor quando se trata de aprofundar a democracia e a cidadania, no entanto, uma casa não se pode construir a partir do telhado.

Há uma realidade social, que não aquela que os estudiosos de gabinete, sentados em Lisboa ou Bruxelas, apontam nos relatórios ou nos trazem em forma de números. O que se passa na rua e em milhares de lares desta região é bem diferente do que muitos pensadores possam julgar. Os filhos deixam de ir à escola porque os pais não têm dinheiro para livros, porque a própria marginalidade em que viveram durante muitos anos os atira para esse beco, tudo porque não houve uma preparação de base, apenas se resumiu à obrigatoriedade da escolaridade ser feita até ao 9º ano.

Quando se fala em conteúdos, estamos a falar da falta de electricistas, de canalizadores, de mecânicos, de pescadores, de agricultores ou pensa-se nas altas tecnologias informáticas? Que realidade temos na nossa região? A maioria dos concelhos não possui creches, nem tão pouco as escolas pré-primárias, a base dos pilares para o básico e o secundário, onde o Governo e as autarquias deviam apostar, colocando aí os melhores professores, aqueles que sentem prazer em ensinar.

Infelizmente, não é disto que os políticos falam, das carências em termos de ensino pré-escolar e, porque não dizê-lo básico, masturbam-se com conselhos superiores e projectos educativos que acabam por morrer nas bermas de uma qualquer rua, porque não acreditamos que o Governo, por mais pio que se possa mostrar, dê asas a estes anjos da guarda para construírem o que quer que seja..

NOTA: Os comentários de Hélder Nunes são emitidos todas as quintas-feiras, às 9 horas, com repetição às 15 e às 21 horas.